A história do termo “urubu” na cultura do Clube de Regatas do Flamengo é uma jornada fascinante que transcende os limites de uma simples provocação. Inicialmente utilizado como uma ofensa pelos rivais, o “urubu” transformou-se em um símbolo de orgulho para a torcida rubro-negra, representando a resiliência e a capacidade de transformar desafios em vitórias, tanto dentro quanto fora de campo.
Raízes da Provocação
A década de 1960 foi marcada por rivalidades intensas no futebol carioca. O Flamengo, tradicionalmente um time que atraía uma base popular de torcedores, era frequentemente alvo de provocações com conotações sociais e raciais. O grito de “urubu, urubu” e “favela, favela” ecoava nos estádios, uma tentativa de menosprezar a base popular e diversificada da torcida rubro-negra.
A Reviravolta dos Quatro Amigos
Em 1969, quatro amigos torcedores do Flamengo decidiram assumir o controle da narrativa e transformar a ofensa em um símbolo de identidade. Armados com coragem e determinação, eles embarcaram em uma missão noturna aos lixões do Rio de Janeiro, à procura de um urubu. A escolha do urubu como mascote tinha o propósito de ironizar a provocação, dando um novo significado ao termo.
A Captura e a Libertação do Urubu
A captura do urubu não foi uma tarefa fácil. Inicialmente, eles buscaram nos lixões da Zona Sul e Zona Norte, mas a noite não revelou o tão desejado mascote. Um gari, também torcedor do Flamengo, indicou que o melhor momento para a captura seria de manhã. Com essa informação, os amigos retornaram no dia seguinte e conseguiram pegar um urubu com a ajuda de um lençol.
O Voo do Urubu no Maracanã
O grandioso dia chegou durante um jogo contra o Botafogo, uma equipe que historicamente causava dificuldades ao Flamengo. Os quatro amigos entraram no Maracanã com o urubu envolto em uma bandeira. No entanto, a ave, agitada e dificultando o controle, foi solta antes do esperado. Com uma bandeira amarrada à sua pata, o urubu voou em círculos pelo estádio, fazendo um voo rasante que surpreendeu a todos.
O Canto da Transformação
A reação da torcida foi instantânea. Percebendo a simbologia por trás do voo do urubu, a multidão começou a cantar “Uh é urubu”, celebrando não apenas a vitória potencial sobre o Botafogo naquele dia, mas também assumindo a alcunha do urubu como um símbolo de orgulho. O Flamengo venceu por 2 a 1, quebrando o tabu contra o Botafogo.
A Subversão e a Identidade Rubro-Negra
A saga do urubu destaca uma característica única e poderosa da torcida do Flamengo: a capacidade de subverter as adversidades e transformar provocações em elementos de orgulho. Ao longo dos anos, a torcida rubro-negra demonstrou uma habilidade incrível de apropriar-se de insultos e zombarias, transformando-os em motivos de celebração e autenticidade.
Do Urubu ao “Cheirinho”: A Subversão Continua
Essa história não é única na trajetória da torcida flamenguista. O cântico “Silêncio na favela”, originalmente uma provocação dos adversários, foi transformado em “Festa na favela” nas vitórias do Flamengo. Mais recentemente, a expressão “cheirinho”, inicialmente usada pejorativamente para zombar da suposta proximidade do Flamengo aos títulos, também foi apropriada pelos torcedores como um grito de confiança e expectativa de conquistas.
Conclusão: Quando o Urubu Voou Alto e Firme
A história do urubu no Flamengo é uma saga de resiliência, paixão e identidade. O que começou como uma provocação dos rivais foi habilmente transformado pela torcida rubro-negra em um símbolo de orgulho e celebração. O urubu voou alto e firme sobre o Maracanã, simbolizando não apenas uma vitória futebolística, mas a conquista da própria narrativa por uma torcida apaixonada. Esse episódio é mais do que uma simples história; é uma expressão viva da relação única entre o Flamengo, sua torcida e a capacidade de transformar desafios em tradições que perduram por gerações.